
Moradores tradicionais da comunidade foram impedidos de votar em 2023 (Foto: Alíria Aristides/ UFMS)
Texto: Guilherme Henri
A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul ingressou na Justiça com uma ação pedindo a anulação da eleição da diretoria e das alterações estatutárias realizadas na Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola de Furnas dos Baianos, no Distrito de Piraputanga, em Aquidauana.
Conforme a defensora pública Janaina de Araujo Sant’Ana Andrade, houve a falta de controle quando à conferência se as pessoas que votaram estariam de fato aptos a votar.
“A lista de presença anexada ao processo confirma a participação de indivíduos sem vínculo de pertencimento ou ascendência quilombola, o que altera diretamente o resultado e descaracteriza a autonomia organizativa da comunidade”, pontua a defensora.
Além das irregularidades no processo eleitoral, a Defensoria aponta que as alterações promovidas no estatuto social da associação foram feitas sem observância mínima de transparência, sem divulgação prévia adequada e sem respeito ao quórum necessário.
“As modificações, aplicadas imediatamente sobre a própria eleição, criam mecanismos que restringem a participação de moradores tradicionais e favorecem a continuidade da diretoria eleita, o que, para a Defensoria, evidencia abuso de poder e afronta princípios legais e constitucionais, como anterioridade, lisura e representação comunitária”, afirma a defensora pública.
A ação da Defensoria destaca que a comunidade quilombola possui história centenária, formada por famílias negras provenientes do estado da Bahia e estabelecidas na região com laços culturais, territoriais e identitários sólidos.
“Por isso, o processo organizativo interno deve respeitar o direito de autodefinição, entendido pela Defensoria como elemento essencial para a preservação da cultura e da autonomia dos povos tradicionais. A interferência de pessoas externas, sobretudo em decisões que influenciam a gestão do território e os rumos da associação, constitui violação direta a esse princípio”, diz.
Pedidos
Diante do cenário, a Defensoria requer em caráter de urgência a suspensão imediata da diretoria eleita e a declaração de nulidade da eleição e das alterações estatutárias. Pede, ainda, que novas assembleias não sejam realizadas enquanto perdurar o litígio, bem como a convocação de um novo processo eleitoral com regras transparentes e participação exclusiva dos moradores quilombolas reconhecidos pela comunidade.
“O objetivo é assegurar que a condução da associação volte a refletir a vontade legítima do grupo e que decisões sobre o futuro da comunidade não sejam afetadas por interferências externas”, conclui a defensora.
O caso agora aguarda decisão judicial.
Defensora pública Janaina de Araujo Sant’Ana Andrade (Foto: Arquivo/ DPMS)

